sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Liberdade Religiosa e Escusa de Consciência.

Maurício Scheinmanadvogado em São Paulo, professor da Faculdade de Direito da PUC/SP, conselheiro departamental da PUC/SP, presidente da Comissão de Fiscalização e Defesa da Advocacia da OAB/SP
Assunto delicado que tem sido suscitado em diversas searas, instituições, administrativas ou judiciais, é a questão da liberdade religiosa e os seus limites. Na qualidade de Conselheiro Departamental da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, fui nomeado para relatar processo envolvendo recurso formulado por discente que por ser praticante da religião judaica de forma ortodoxa, estaria impossibilitado de comparecer às aulas ministradas aos sábados, conforme a grade curricular e programa da Instituição.
Buscando analisar a questão de forma legalista, mas sem abandonar a idéia de que estamos em pleno período de exercício dos direitos humanos em sua plenitude, pude preparar voto, dando pelo provimento do apelo ofertado. No mesmo voto, teci considerações acerca da nova concepção dos direitos humanos, da liberdade do indivíduo e da liberdade religiosa em espécie.
Não se trata aqui de mera compilação ou repetição do voto proferido – e acatado por unanimidade pelo órgão recursal – mas apenas de extração dos conceitos fundamentais que nortearam a opinião legal, buscando trazer subsídios não só àqueles discentes que sofrem reveses em vista de professarem uma outra fé, mas até mesmo objetivando traçar, em linhas gerais, princípios aplicáveis à todas as situações em que, de alguma forma, por imposição legal, estatutária, hierárquica, etc., se verifique o cerceamento da liberdade religiosa, no exercício das atividades normais ou usuais do cidadão.
Não tenho aqui a pretensão de esgotar o tema que se mostra deveras complexo, mas apenas de externar as razões que me levaram ao posicionamento adotado e que de alguma forma possam ser úteis àqueles que sofram discriminação relativamente à fé que professam.
Relativamente ao comparecimento às aulas, prestação de provas, realização de trabalhos nos dias reputados "santificados", embora extremamente delicada a questão, o fulcro da mesma reside na proteção ou não outorgada pela Carta Constitucional àqueles que professam religião diversa da adotada pelo País e se, à luz das disposições maiores, têm ou não o direito praticar, ou abster-se de praticar determinados atos em razão de impedimentos emergentes da fé da qual são adeptos.
A santificação e a guarda de um dia da semana representa um aspecto teológico fundamental para diversas religiões. Embora o sentido teológico e histórico do dia da guarda ou adoração varie entre as diferentes religiões, é inegável que a observância de práticas religiosas, em particular ou em público, no "Dia do Senhor", possibilite conflitos entre obrigações legais e princípios religiosos.
É direito fundamental de toda pessoa não ser obrigada a agir contra a própria consciência e contra princípios religiosos. Segue-se daí, não ser lícito obrigar-se cidadãos a professar ou a rejeitar qualquer religião, ou impedir que alguém entre ou permaneça em comunidade religiosa ou mesmo a abandone.
O direito de liberdade de consciência e de crença deve ser exercido concomitantemente com o pleno exercício da cidadania.
Qualquer tentativa no sentido de pressionar o poder público na elaboração de leis civis que tenham em conta o dever ou a obrigação de santificar qualquer dia com o "Dia do Senhor", representa um retrocesso histórico inaceitável e um atentado contra o direito de liberdade religiosa.
A lei a todos obriga, sejam cristãos, muçulmanos, judeus, católicos, protestantes, hindus, budistas, etc., tenham eles religião ou não.
A utilização geral de uma lei pelo Poder Público para impor à todos os cidadãos determinados valores religiosos e doutrinários, ligando a Religião ao Estado, é a principal fonte de intolerância religiosa ao longo da história.
A Organização das Nações Unidas – ONU -, na sua célebre DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, assim dispôs:
"ARTIGO 18. Todo homem tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância isolada ou coletivamente, em público ou em particular".
Para tornar esse dispositivo ainda mais claro, a mesma Organização das Nações Unidas – ONU, fez editar a DECLARAÇÃO SOBRE A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE INTOLERÂNCIA E DISCRIMINAÇÃO BASEADAS EM RELIGIÃO OU CRENÇA (Resolução n.º 36/55). Desse documento extraímos os seguintes trechos:
"Art. 1º. Ninguém será sujeito à coerção por parte de qualquer Estado, instituição, grupo de pessoas ou pessoas que debilitem sua liberdade de religião ou crença de sua livre escolha".
"Art. 6º. O direito à liberdade de pensamento, consciência, religião ou crença incluirá as seguintes liberdades:
.........
h) OBSERVAR DIA DE REPOUSO e celebrar feriados e cerimônias de acordo com os preceitos da sua religião ou crença.".
Neste sentido também é a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), ingressa no sistema pátrio nos termos do Decreto n.º 678, de 06 de novembro de 1992, cujo art. 12, alínea 2, explicita:
"Artigo 12. Liberdade de Consciência e de Religião
.......
2. Ninguém pode ser objeto de medidas restritivas que possam limitar sua liberdade de conservar sua religião ou suas crenças, ou de mudar de religião ou de crenças.".
Garante, ainda, o artigo 26 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos:
"Artigo 26. Todas as pessoas são iguais perante a lei e têm direito, sem discriminação alguma, a igual proteção da lei. A este respeito, deverá proibir qualquer forma de discriminação e garantir a todas as pessoas proteção igual e eficaz contra qualquer discriminação por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, situação econômica, nascimento ou qualquer opinião.".
Cabe lembrar que, por força do disposto no § 2.º, do art. 5.º, da Constituição Federal, tais tratados internacionais integram o Direito pátrio tal como se aqui originariamente positivados.
O reconhecimento de que todos os seres humanos têm direitos e liberdades fundamentais inerentes à condição humana e, de que toda nação têm a obrigação de respeitar os direitos fundamentais de seus cidadãos, parece ser uma característica que marca o presente tempo. Embora essa idéia tenha há muito tempo surgido na história e no pensamento humano, a concepção de que os direitos fundamentais dos seres humanos constitua objeto de uma regulação por parte da Comunidade Internacional, isto é, o seu reconhecimento, desenvolvimento, preservação e responsabilização, emergiu somente após as terríveis violações dos direitos humanos pelos regimes totalitários Alemão, quando verificou-se o que fora o holocausto, e o Soviético.
As atrocidades cometidas contra os seus próprios cidadãos, bem como contra estrangeiros, representou uma violência que chocou a consciência de toda a Humanidade. Sob este pano de fundo, as nações de todo mundo decidiram que a promoção dos direitos humanos e liberdades fundamentais deveria ser o principal objetivo da Organização das Nações Unidas (ONU).
Esses direitos não poderiam mais ser concebidos ou reconhecidos como uma generosa concessão dos Estados soberanos, mas passaram a ser considerados como inerentes ou inalienáveis à todos os seres humanos, e desta forma, não poderiam ser desrespeitados, negados ou reduzidos por qualquer motivo.
Este grande movimento internacional de defesa dos direitos humanos, concretizado sob a forma de Tratados, Acordos ou Pactos Internacionais voltados à proteção dos direitos humanos, é baseado na concepção de que toda nação têm a obrigação de respeitar os direitos humanos de seus cidadãos e de que todas as nações e a comunidade internacional têm o direito e a responsabilidade de protestar, se um determinado País não cumprir suas obrigações.
Quando um Estado ratifica um determinado Tratado, aceita as obrigações jurídicas decorrentes do mesmo e passa a se submeter à autoridade das instituições internacionais, que garantem a sua eficácia.
No Brasil, a Constituição Federal, de 1988, consagrou de forma inédita que os direitos e garantias expressos na Constituição "não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte." (art. 5°, § 2°). Assim, os direitos garantidos nos Tratados de Direitos Humanos ratificados pelo Brasil integram a relação de direitos constitucionalmente protegidos.
Trata-se de inegável avanço no sentido da proteção dos direitos fundamentais, particularmente quanto ao direito de liberdade de consciência e de liberdade religiosa.
Os grandes textos históricos ou jurídicos que tratam dos direitos humanos consagram, à unanimidade, a dignidade do ser humano como seu fundamento de validade. Nesse sentido a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 1948, afirma categoricamente que "todos os seres humanos nascem livres e iguais, em dignidade e direitos" (art. 1°).
O reconhecimento e a proteção da dignidade humana tornou-se, em nossos dias, um imperativo categórico moral e jurídico para a maioria das Nações.
Mas em que consiste, ao certo, a dignidade do ser humano?
A elevação da dignidade humana ao mais alto patamar valorativo pela Comunidade das Nações pressupõe que possamos encontrar uma resposta a esta persistente questão – em que consiste a dignidade humana? – que seja universalmente aceita por todos os povos, culturas e nações que compõem a Comunidade Internacional. Será possível estabelecer tal consenso?
Para tentar responder a esta pergunta temos que enfrentar também outra difícil questão, qual seja, saber qual é nosso conceito ou entendimento sobre a essência ou natureza do ser humano. Qualquer tentativa em encontrar uma possível resposta a estas duas necessárias e persistentes questões – em que consiste a dignidade humana? o que entendemos como sendo a essência ou natureza do ser humano? – sofrerá a influência de valores morais, religiosos, culturais, filosóficos, éticos, etc., daquele que se propõe a apresentar uma resposta.
Qualquer que seja nossa compreensão do que seja a natureza humana, parece-nos indiscutível a aceitação de que existem direitos humanos inalienáveis, inderrogáveis e insubstituíveis e que não podem ser objeto de restrições ou limitações por parte de nenhum país, pessoa ou poder deste mundo.
Ao enfrentarmos estas questões, talvez possamos reconhecer o que Kant, em sua obra "Fundamentos para uma Metafísica dos Costumes", tenha apresentado uma boa resposta. Para Kant, o homem é o único ser capaz de orientar suas ações a partir de objetivos racionalmente concebidos e livremente desejados. A dignidade do ser humano consistiria em sua autonomia, que é a aptidão para formular as próprias regras de vida, ou seja, sua liberdade individual ou livre arbítrio.
A noção de autonomia do indivíduo em relação aos demais membros de um determinado grupo social surgiu na História associada ao nascimento da Reforma Protestante. Pela primeira vez recuperou-se, em reformadores como Lutero, Calvino, Knox e outros, a consciência individual como sendo a suprema norteadora das ações humanas. Cada ser humano deve agir com base na sua própria consciência sendo responsável, neste mundo, por suas decisões individuais.
O desenvolvimento dessa consciência ética individual colocou o livre arbítrio do ser humano, e a sua respectiva responsabilização terrena ou religiosa de seus atos, no epicentro de um movimento verdadeiramente revolucionário.
Em lugar da tradição e da autoridade suprema do clero e da nobreza, colocou-se a soberania de cada indivíduo, em todos os aspectos relativos a sua vida íntima e social. Lançou-se, naquele momento, as bases daquilo que se chamaria soberania popular, em substituição à concepção de soberania da Igreja e do Monarca.
É dentro dos marcos estabelecidos pela Reforma Protestante que surgiu o movimento em prol da declaração e do reconhecimento dos Direitos Humanos em sua primeira fase ("primeira geração"). Destacou-se a obra dos puritanos anglo-saxões que intentariam, posteriormente, fundar no Novo Continente, nos Estados Unidos, uma sociedade radicalmente contrária ao Estado monárquico-eclesiástico existente no Velho Mundo (Inglaterra), opressor dos indivíduos pela negação da sua liberdade de consciência e de religião.
É fundamental destacarmos que a verdadeira certidão de nascimento dos direitos humanos pode ser identificada precisamente na Declaração de Independência dos Estados Unidos e no Bill of Rigths do Estado da Virgínia, em 1776.
A Declaração de Direitos de Virgínia afirma categoricamente que "todos os seres humanos são pela sua natureza, igualmente livres e independentes" e o reconhecimento definitivo de que "todo poder pertence ao povo e, por conseguinte, dele deriva". (arts. 1° e 2°)
Nesse mesmo sentido a Primeira Emenda à Constituição norte-americana, de 1791, dispõe que "[O] Congresso não editará nenhuma lei instituindo uma religião, ou proibindo o livre exercício dos cultos ; nem restringirá a liberdade de palavra ou de imprensa; ou o direito do povo de reunir-se pacificamente, ou de petição ao governo para a correção de injustiças".
Podemos assim compreender porque a liberdade de consciência, de crença e de opinião representou o fundamento ou a pedra angular sobre a qual se buscou construir uma sociedade livre para os habitantes da América do Norte.
A história dos direitos humanos seguiu seu curso. Em 1789 a Assembléia Nacional francesa defendeu a universalização dos direitos humanos durante a fase revolucionária. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, do mesmo ano, afirmou categoricamente: "Tendo em vista que a ignorância, o esquecimento ou desprezo dos direitos do homem são as únicas causas dos males públicos e da corrupção dos governos, [os representantes do povo francês] resolveram declarar solenemente os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem".
Foram reconhecidos e afirmados dessa forma os Princípios da Liberdade e da Igualdade tanto na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, quanto no Bill of Rights de Virgínia, de 1776.
Foi apenas alguns anos mais tarde, com a Constituição francesa, de 1791, que a noção de Fraternidade ou Solidariedade veio a ser declarada, não como um princípio jurídico, mas como uma virtude cívica dos cidadãos franceses: "serão estabelecidas festas nacionais para manter a lembrança da Revolução Francesa, promover a fraternidade entre os cidadãos e vinculá-los à Constituição, à Pátria e às Leis" (título primeiro).
Uma vez constituídos e afirmados, os Princípios da Liberdade, Igualdade e Solidariedade, transformaram-se, ao longo do tempo, em valores supremos do sistema universal dos direitos humanos cuja validade atinge nossos dias.
Resumidamente podemos identificar o desenvolvimento dos direitos humanos em três fases. Inicialmente, afirmaram-se os direitos de liberdade, incluindo-se nestes todos os direitos que tendem a limitar o poder do Estado e a reservar para o indivíduo, ou para os grupos particulares, uma esfera de Liberdade em relação ao Estado. Num segundo momento, afirmaram-se os direitos políticos, os quais – concebendo a liberdade não apenas negativamente, como não impedimento, mas positivamente, como autonomia – tiveram como consequência a participação cada vez mais ampla, generalizada e freqüente dos membros de uma comunidade no poder político. A Liberdade no Estado. Finalmente, foram proclamados os direitos sociais, que expressam a emergência de novas exigências e novos valores em busca da igualdade não apenas formal mas sobretudo real e concreta. A busca do desenvolvimento social, do bem estar, caracterizou a Liberdade através ou por meio do Estado.
Conforme bem esclarece Aldir Soriano, em ótima síntese acerca do tema, externada em palestra anteriormente proferida,
"a questão da Liberdade Religiosa é extremamente complexa e delicada. É complexa porque a compreensão desse tema depende de uma abordagem interdisciplinar e, por conseguinte, de incursões que vão além da ciência jurídica (direito), envolvendo, também, a história, a teologia, a antropologia, a ciência da religião e a filosofia. O tema é delicado porque revela o desafio de se conviver num mundo plural, em que a intolerância religiosa ainda está presente. Existe nas religiões, como veremos, uma tendência à intolerância. Ademais, o tema envolve questões complexas, como a observância do sábado bíblico, o ensino religioso nas escolas públicas e o diálogo inter-religioso.
A violência religiosa invadiu a propalada "era dos direitos" de Norberto Bobbio e se instalou no século XXI. Essa forma de violência é uma das questões centrais do presente século. Tal tendência já havia sido verificada com o fim da Guerra Fria, pois o conflito bipolar entre o capitalismo e o socialismo foi substituído pelos conflitos de natureza étnica e religiosa. Em plena era do direito internacional dos direitos humanos, é surpreendente verificar que, ao redor do globo terrestre, pessoas são espancadas, perseguidas e mortas, simplesmente, porque mudaram de religião. Ademais, mesmo em países democráticos e comprometidos internacionalmente com a proteção dos direitos humanos, os seus cidadãos são passíveis de uma perseguição velada e dissimulada, com restrições aos direitos econômicos, sociais e culturais. Por vezes, o acesso ao mercado de trabalho e aos cargos públicos ou a conquista de um simples diploma, podem custar o sacrifício da consciência.".
Neste ponto importante definir o que vem a ser a "liberdade religiosa", como uma das pedras angulares da civilização moderna.
Aliás, em que consiste a liberdade? É a faculdade, como poder outorgado à pessoa para que possa agir, pensar, comportar-se segundo a sua própria determinação, respeitadas as regras pétreas instituídas. Trata-se a liberdade, pois, da expressão da faculdade de se fazer o que se quer, de pensar como se entende, de ir e vir a qualquer parte, quando e como se queira, exercer qualquer atividade, tudo conforme a livre determinação da pessoa, quando não haja regra proibitiva para a prática de ato ou não se institua princípio restritivo ao exercício da liberdade (Cf. De Plácido e Silva). Os romanos assim definiam a liberdade: "a liberdade é a faculdade natural de fazer cada um o que deseje, se a violência ou o direito lhe não proibe". "Libertas est naturalis facultas e jus quod cuique facere libet, nisi si quid vi aut jure prohibetur." (Cf. César da Silveira, Dicionário de Direito Romana).
A liberdade religiosa consiste na aplicação do conceito de "liberdade" às práticas relacionadas à fé seja ela ela qual for, naturalmente não se podendo prestar a fins expressamente proibidos pelo sistema normativo.
Neste toada, interessante trazer à colação interessente digressão acerca do tema, (também cf. Aldir Soriano), verbis:
"Foi no século III d.C que a expressão liberdade religiosa – libertas religionis – foi, provavelmente, utilizada pela primeira vez, por Tertuliano, advogado convertido ao cristianismo e que passou a defender a liberdade religiosa em face dos abusos do Império Romano. A liberdade religiosa é, como se sabe, um direito humano fundamental, assegurado pelas Constituições dos diversos Estados democráticos e, também, por importantes declarações e tratados internacionais de direitos humanos. Contudo, estamos tratando, até aqui, de apenas uma acepção da liberdade religiosa. Há pelo menos mais duas acepções que devem ser abordadas.
A liberdade religiosa comporta pelo menos três acepções: jurídica, teológica ou eclesiástica e bíblica.
No que se refere à liberdade religiosa na acepção jurídica, a mesma compreende, essencialmente, a liberdade religiosa como um direito fundamental da pessoa humana. Nesse sentido, Segundo Jorge Miranda, a liberdade religiosa ocupa o cerne da problemática dos direitos humanos. Ora, no curso da história da humanidade, o direito à liberdade religiosa representa uma conquista extremamente recente. Pode ser identificada nas três fases da era dos direitos, mencionadas por Norberto Bobbio. Segundo o autor italiano, os direitos humanos "nascem como direitos naturais universais, desenvolvem-se como direitos positivos particulares, para finalmente encontrarem sua plena realização como direitos positivos universais". Como direito natural, a liberdade religiosa surgiu no século XVIII, com as primeiras declarações de direitos de 1776 (americana) e 1789 (francesa). Como direito efetivamente tutelado, a liberdade religiosa surgiu com a Constituição Americana. Como direito internacional, a liberdade religiosa surgiu no Segundo Pós-Guerra, com o desenvolvimento do sistema global de proteção aos direitos humanos ligado à Organização das Nações Unidas – ONU.
O discurso teológico da liberdade religiosa compreende uma doutrina teológica na qual só se reconhecem os direitos nos limites da Igreja Católica. Essa doutrina foi fundamentada no pensamento de Santo Agostinho (Guerra Justa) e de Santo Tomás de Aquino.
A liberdade religiosa no sentido bíblico é um "Dom de Deus", como observa John Graz. O Criador concedeu o livre arbítrio para os homens. "Ora, o Senhor é o Espírito; e, onde está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade." (Coríntios 3: 17) Porém, todos prestarão conta a Deus.".
Portanto, nas três acepções da liberdade religiosa, quando uma instituição, como uma Universidade, impõe a um discente a condição de renunciar, mesmo que temporariamente, sua crença para que possa conservar o direito de graduar-se, está, inquestionavelmente, limitando, restringindo, a liberdade desse aluno.
Desta maneira, na busca por uma sociedade mais justa, nada mais natural que sejam observados os princípios fundamentais que norteiam a liberdade religiosa. Nas palavras de Rui Barbosa: "Onde há liberdade religiosa como na Constituição brasileira e na americana, não há, nem pode haver, questão religiosa. A liberdade e a Religião são sociais, não inimigas. Não há religião sem liberdade. Nasci na crença de que o mundo não é só matéria e movimento, os fatos morais não são um mero produto humano. O estudo e o tempo me convenceram que as leis do Cosmos sejam incompatíveis com uma causa suprema, de que todas as coisas dependem.".
Finalmente, de importância crucial é o art. 5º da Constituição Federal que traz em seus incisos VI, VII e VIII, dispositivos sobre liberdade religiosa, como segue:
"Artigo 5º.
....
VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença;
....
VIII – ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei.".
Impõe-se notar, também, que os direitos e garantias fundamentais têm eficácia plena e aplicabilidade imediata, independendo, portanto, de qualquer outra norma infra-constitucional ou manifestação do Poder Público para produzir efeitos. Neste sentido, é claro o texto constitucional, em seu artigo 5°, § 1°, verbis:
"As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata".
Poder-se-ia questionar a procedência do remédio constitucional em razão do princípio da igualdade. Deve-se dizer, no entanto, que tal princípio, para sua efetiva concretização, deve ser analisado formal e materialmente. Pode ser que se imponha uma desigualdade formal para se garantir uma igualdade material. Assim, em determinados casos impõe-se a autorização de discriminação — desigualdade do ponto de vista formal — para que se reafirme o princípio da igualdade em sua essência material.
Ora, para a esmagadora dos cidadãos do País, que são cristãos e que guardam o domingo, não haverá aulas, provas ou concursos no dia que consagram. O que se defende é o tratamento igual àqueles que guardam o sábado. Não se fere, portanto, o princípio da isonomia.
Ademais, a própria Constituição, protetora do princípio da igualdade, também autoriza certas limitações à mesma liberdade como na previsão da chamada "escusa de consciência", nos termos do artigo 5º, inciso VIII, visando a garantia das liberdades de pensamento e opinião.
Assim, é evidente que a obrigação de praticar atividade num determinado horário de sábado, ao ser descumprida porque a decisão recursal assim permitiu ou determinou, fixando-se uma alternativa, não fere a norma constitucional; ao contrário, propicia a liberdade de convicção sem ferí-la.
Sobre essa matéria já existem julgados de nossos Tribunais, que naturalmente podem servir de norte para uma melhor intelecção da questão.
Cita-se exemplificativamente os seguintes feitos e decisões:
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Rio Grande do Sul, julgando em 12/12/95 o recurso contra sentença que concedeu mandado de segurança para a realização de prova de concurso em dia diverso, por motivo de crença religiosa, negou provimento ao recurso confirmando a sentença que deu o benefício, tendo o v. acórdão sido assim redigido:
"TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL-TRF4. Relatora: Juíza Silvia Goraieb. Decisão Unânime. Acórdão nº RIP – 04092560
EMENTA – 1. Não há prejuízo ao interesse público, nem ao procedimento do concurso se por força de liminar a impetrante realizou a prova do concurso em momento não conflitante com sua crença religiosa, por pertencer à Igreja Adventista do Sétimo Dia, que tem o Sábado como dia de guarda.
2. Resguardado no princípio constitucional que assegura a liberdade de crença e de consciência. Bem como aqueles que regem a administração quando se trata de concurso público.
3. Remessa oficial improvida.".
No Estado do Pernambuco, na 2ª Vara da Justiça Federal (Autos n.º 90.5816-3), julgou-se caso que envolvia a Universidade Federal de Pernambuco, a qual realizava as provas do vestibular nos dias de Sábado, tendo sido concedida liminar como segue:
"Assim sendo com base no inciso II do art. 7° da Lei n° 1533/51 e inciso VIII do art. 5° da Constituição Federal, concedo a liminar pleiteada e determino que o Sr. Presidente da Comissão de Vestibular das Universidades Federal e Rural de Pernambuco- CONVEST, Sr. Murilo Cezar Amorim Silva, ou seu substituto legal, tome as providências para assegurar o direito de os impetrantes submeterem-se às provas do vestibular, marcadas para o próximo dia 08, Sábado, de tal forma que sejam respeitadas suas convicções religiosas, ou seja, que possam iniciar a realização das referidas provas somente após o pôr do sol do mencionado dia, ou no dia seguinte, a critério da autoridade impetrada, sem prejuízo evidente da fiscalização. Notifique-se a autoridade impetrada a apresentar informações no prazo legal. No momento oportuno, ao MPF para ofertar parecer no prazo legal. Publique-se. Intime-se. Recife, 05 de dezembro de 1990. Francisco Alves dos Santos Júnior. Juiz Federal 2ª Vara - PE.".
No Estado de São Paulo, a Juíza Maria de Fátima dos santos Gomes, ao julgar mandado de segurança impetrado por Frederick Malta Buarque de Gusmão, médico cardiologista, em decorrência de prova designada para o Sábado (06/06/98), em concurso da Polícia Militar, proferiu, ao final, a seguinte sentença, da qual se extraem alguns trechos:
"Frederick Malta Buarque de Gusmão, médico cardiologista, impetrou mandado de segurança, com pedido de liminar, contra o Sr. Coronel Diretor de Pessoal da Polícia Militar do Estado de São Paulo, alegando em síntese que a prova foi marcada para um Sábado, dia em que o impetrante não pode realizar o exame, por força de credo religioso, com amparo constitucional... Foi deferida a liminar (fls. 34). A autoridade apontada como coatora prestou informações. O Ministério Público opinou pela denegação; É o relatório. DECIDO. Trata-se de mandado de segurança interposto por inscrito em concurso público, insurgindo-se contra o indeferimento de requerimento para designação de nova data para realização na data marcada, por força de credo religioso. Malgrado o zelo e o esforço da digna autoridade coatora, é de rigor a concessão da segurança, merecendo amparo a pretensão do impetrante. Com efeito, é assegurada constitucionalmente a liberdade de credo religioso, sendo vedada qualquer privação de direitos por força de opção religiosa como dispõe o inciso VIII do art. 5º da Constituição Federal. De fato, nota-se que o impetrante, preenchendo os requisitos necessários para a participação no concurso, está impossibilitado de exercer o direito de possibilidade de acesso à função pública, assegurado a todos os brasileiros no inciso I do art. 37 da Carta Magna. Assim, a inadequação do concurso público com a liberdade do credo religioso, apresenta violação aos princípios da acessibilidade à função pública, da igualdade e da liberdade de credo religioso. Ante o exposto, por esses fundamentos e por tudo o mais que dos autos constam, julgo PROCEDENTE o pedido, CONCEDENDO a segurança rogada, tornando definitiva a liminar concedida, a fim de ser julgada nova data para realização do exame, arcando o impetrado com as custas e despesas processuais na forma da lei. São Paulo, 06 de julho de 1998. Maria de Fátima dos Santos Gomes. Juíza de Direito".
No mesmo sentido, o Juízo da 11.ª Vara da Justiça Federal de Porto Alegre-RS, concedeu liminar em mandado de segurança, conforme decisão abaixo transcrita:
"Impetrante: Valdson Silva Cleto. Mandado de Segurança n° 98.0025525-7. Impetrada: Diretora Regional da Escola de Administração Fazendária. Pelo presente mandado de segurança, pretende o impetrante ver assegurado o direito de realizar as provas do concurso de Auditor-Fiscal do Tesouro Nacional-AFTN, no próximo dia 17, a partir das 19 horas, após o crepúsculo vespertino náutico. Narra na inicial que professa sua fé segundo a Doutrina Adventista, que tem como dia de guarda o Sábado, e que, portanto, não poderá submeter-se à realização das provas no horário designado para o dia 17 de outubro (13 horas), já que se trata de período em que se deve se abster de atividade que não as vinculadas diretamente à sua religião. Fundamenta seu pedido na liberdade de crença garantida constitucionalmente. Examino o pedido de liminar. Há relevância nos fundamentos do impetrante. A Constituição garante, efetivamente, no inciso VI do art. 5º, a liberdade de consciência e de crença, assegurando o livre exercício dos cultos religiosos. O impetrante é membro em exercício da Igreja Adventista do Sétimo Dia, que tem o Sábado como dia de guarda, o que impõe aos fiéis que se abstenham de atividades seculares do pôr-do-sol de Sexta-feira ao pôr-do-sol de Sábado. A falta de simultaneidade não se constitui em circunstâncias que afetem o interesse público e a isonomia, pois a prova será realizada pelo requerente no mesmo dia, porém após as 19 horas, com a mesma duração prevista para os demais candidatos e será preservado o sigilo. Neste contexto, e para resguardar a liberdade de crença e de consciência, defiro a medida liminar para o efeito de assegurar ao impetrante a realização da prova do concurso para AFTN, designada para o próximo Sábado – 17 de outubro, em horário especial – a partir das 19 horas, devendo a autoridade impetrada adotar as providências necessárias à preservação do candidato em condição de incomunicabilidade, nas dependências do local onde se realizará a prova, a partir do horário de início previsto para os demais concorrentes. Oficie-se para cumprimento e informações. Após, ao Ministério Público Federal, voltando conclusos para a sentença. Em 16 de outubro de 1998. Taís Schilling Ferraz. Juíza Federal da 11ª Vara.".
Em outro mandado de segurança, impetrado por Jefferson Antonio Quimelli, residente em Curitiba-PR, a Juíza Leda de Oliveira Pinho, da 2.ª Vara Federal, proferiu a seguinte liminar:
"Mandado de Segurança n° 98.0023378-4. Impetrante: Jefferson Antonio Quimelli. Impetrado: Diretor da Escola de Administração Fazendária do Paraná. DECISÃO (em plantão). Trata-se de mandado de segurança com pedido de liminar para que o impetrado promova condições de o impetrante realizar a prova marcada para o dia 17/10/98 (Sábado) em horário compatível com sua crença religiosa, ou seja, após o pôr-do-sol desse dia, devendo o início da prova se dar a partir de 19:15 e término às 00:05 horas do dia 18/10/98. Sustenta, com fulcro no art. 5° "caput" e inciso 6°, da Constituição Federal, seu direito líquido e certo de obrigar a autoridade coatora a providenciar condições para que participe das provas em horário compatível com sua convicção religiosa. DECIDO. São relevantes os fundamentos da impetração. Os princípios constitucionais devem ser interpretados harmoniosamente. Assim, a norma constitucional que prevê o acesso aos cargos públicos tão só mediante concurso público, não pode violar outras garantias constitucionais, tais como o direito de liberdade, de consciência e de crença, previsto no artigo 5º, inciso VI, da Constituição Federal. Nesse sentido, a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, conforme ementa a seguir transcrita: EMENTA: Administrativo. Mandado de segurança. Remessa oficial, direito de prestar prova física de concurso em dia diverso do determinado. Liberdade de crença religiosa. 1. Não há prejuízo ao interesse público, nem ao procedimento do concurso público, se, por força de liminar, a impetrante realizou a prova em momento não conflitante com sua crença religiosa por pertencer a igreja Adventista do Sétimo Dia que tem o Sábado como dia de guarda. 2. Resguardo do princípio constitucional que assegura a liberdade de crença e de consciência bem como aqueles que regem a administração quando se trata de concurso público. 3. Remessa oficial improvida. (Proc.: REO 0409256-95/RS, Tribunal: TR4, Turma: 04, REL. JUIZ: Juíza Silvia Goraieb, Decisão: 12/12/1995, unânime, DJ 24/01/96, PG: 02506). O "periculum in mora" é evidente, porquanto o retardo na prestação jurisdicional ocasionará ao impetrante grave dano, uma vez que o concurso está marcado para o próximo dia 17. Pelo exposto, defiro a liminar, nos termos em que requerida. Oficie-se ao impetrado para que dê cumprimento a esta liminar e para que, no prazo de 10 dias apresente as informações que tiver. Curitiba, 15 de outubro de 1998. Leda de Oliveira Pinho. Juíza Federal / 2ª Vara em plantão.".
Verifica-se, portanto, que o próprio Poder Judiciário tem estado sensível ao problema tal como suscitado pelo recorrente.
De fato, a sugestão de suprimento das faltas ou datas e horários alternativos para a prática de determinada atividade, é de difícil, mas não de impossível execução, podendo, pois, ser acatada, já que não traz qualquer prejuízo ao interesse público, apenas protegendo a liberdade individual-religiosa daquele que por sua fé, guarda o dia do sábado.
Neste sentido, cita-se o constitucionalista português Jorge Miranda que ressalta a importância da liberdade religiosa, e afirma que ela está "no cerne da problemática dos direitos humanos fundamentais, e não existe plena liberdade cultural nem plena liberdade política sem essa liberdade pública, ou direito fundamental".
Na doutrina pátria, Rui Barbosa também preconizava: "de todas as liberdades sociais, nenhuma é tão congenial ao homem, e tão nobre, e tão frutificativa, e tão civilizadora, e tão pacífica, e tão filha do Evangelho, como a liberdade religiosa.".
Outrossim, em se tratando o Brasil de Estado que, na sua esmagadora maioria, professa a fé cristã, entendemos oportuno transcrever trecho de discurso proferido por Sua Santidade o Papa João Paulo II aos participantes da 69ª Conferência da União Interparlamentar (Vaticano, 18 de setembro de 1982), como segue:
"É oportuno mencionar ainda o problema da liberdade religiosa. Sabeis que a Igreja não pede privilégio algum ao poder civil; com uma clareza que, desde o Concílio, sobressai ainda melhor que no passado, definiu uma posição global segundo a qual a liberdade religiosa não é senão uma das faces do prisma unitário da liberdade: esta é elemento constitutivo essencial de uma sociedade autenticamente moderna e democrática. Por conseguinte, nenhum Estado pode pretender beneficiar de uma estima positiva e, com mais forte razão, ser considerado merecedor pelo único facto de parecer conceder a liberdade religiosa, quando de facto a isola de um contexto geral de liberdade; e um Estado não pode definir-se "democrático" se de qualquer modo põe obstáculos à liberdade religiosa não só no que diz respeito ao exercício da prática do culto, mas ainda à participação num pé de igualdade nas actividades escolares e educativas, como também nas iniciativas sociais, nas quais a vida do homem moderno se articula cada vez mais. A história, mesmo a mais recente, atesta que os responsáveis civis preocupados com o bem do seu povo não têm nada a temer da Igreja, pelo contrário, respeitando-lhe as actividades, proporcionam ao próprio povo um enriquecimento, porque utilizam um meio certo de melhoramento e de elevação.".
Neste diapasão, importante trazer à colação os termos da Declaração Dignitatis Humanae sobre a liberdade religiosa, de cujo texto extraímos os seguintes trechos:
"1. Os homens de hoje tornam-se cada dia mais conscientes da dignidade da pessoa humana e, cada vez em maior número, reivindicam a capacidade de agir segundo a própria convicção e com liberdade responsável, não forçados por coação, mas levados pela consciência do dever. Requerem também que o poder público seja delimitado juridicamente, a fim de que a honesta liberdade das pessoas e das associações não seja restringida mais do que é devido. Esta exigência de liberdade na sociedade humana diz respeito principalmente ao que é próprio do espírito, e, antes de mais, ao que se refere ao livre exercício da religião na sociedade. Considerando atentamente estas aspirações, e propondo-se declarar quanto são conformes à verdade e à justiça, este Concílio Vaticano investiga a sagrada tradição e doutrina da Igreja, das quais tira novos ensinamentos, sempre concordantes com os antigos. capítulo i. ASPECTOS GERAIS DA LIBERDADE RELIGIOSA. Objeto e fundamento da liberdade religiosa. 2. Este Concílio Vaticano declara que a pessoa humana tem direito à liberdade religiosa. Esta liberdade consiste no seguinte: todos os homens devem estar livres de coação, quer por parte dos indivíduos, quer dos grupos sociais ou qualquer autoridade humana; e de tal modo que, em matéria religiosa, ninguém seja forçado a agir contra a própria consciência, nem impedido, dentro dos devidos limites, de proceder segundo a mesma, em particular e em público, só ou associado com outros. Declara, além disso, que o direito à liberdade religiosa se funda realmente na própria dignidade da pessoa humana, qual a palavra revelada de Deus e a própria razão a dão a conhecer. Este direito da pessoa humana à liberdade religiosa, na ordem jurídica da sociedade, deve ser de tal modo reconhecido que se torne um direito civil. Conforme a própria dignidade, todos os homens, visto que são pessoas dotadas de razão e de vontade livre e por isso mesmo com responsabilidade pessoal, são levados pela própria natureza e também obrigados moralmente a procurar a verdade, antes de mais a que diz respeito à religião. Têm também obrigação de aderir à verdade conhecida e de ordenar toda a sua vida segundo as exigências dela. Ora, os homens não podem não satisfazer a esta obrigação em conformidade com a própria natureza, a não ser que gozem ao mesmo tempo de liberdade psicológica e imunidade de coação externa. O direito à liberdade religiosa não se funda, pois, na disposição subjetiva da pessoa, mas na sua própria natureza. Por esta razão, o direito a esta imunidade persevera ainda naqueles que não satisfazem à obrigação de buscar a verdade e a ela aderir; e, desde que se guarde a justa ordem pública, o seu exercício não pode ser impedido... ... A promoção da liberdade religiosa. 6. Dado que o bem comum da sociedade, que é o conjunto das condições de vida social que possibilitam aos homens alcançar mais plena e facilmente a própria perfeição, consiste sobretudo na salvaguarda dos direitos e deveres da pessoa humana, o cuidado pela liberdade religiosa incumbe tanto aos cidadãos como aos grupos sociais, aos poderes civis, à Igreja e às outras comunidades religiosas, segundo o modo próprio de cada uma, e de acordo com as suas obrigações para com o bem comum. Pertence essencialmente a qualquer autoridade civil defender e promover os direitos humanos invioláveis. Deve, por isso, o poder civil assegurar eficazmente, valendo-se de leis justas e outros meios convenientes, a tutela da liberdade religiosa de todos os cidadãos, e proporcionar condições favoráveis ao desenvolvimento da vida religiosa, de modo que os cidadãos possam realmente exercitar os seus direitos e cumprir os seus deveres, e a própria sociedade se beneficie dos bens da justiça e da paz que derivam da fidelidade dos homens a Deus e à sua santa vontade. Se, em razão das circunstâncias particulares dos diferentes povos, se atribui a determinado grupo religioso um reconhecimento civil especial na ordem jurídica, é necessário que, ao mesmo tempo, se reconheça e assegure a todos os cidadãos e comunidades religiosas o direito à liberdade em matéria religiosa. Finalmente, a autoridade civil deve tomar providências para que a igualdade jurídica dos cidadãos, a qual também pertence ao bem comum da sociedade, nunca seja lesada, clara ou larvadamente, por motivos religiosos, nem entre eles se faça qualquer discriminação. Daqui se conclui que não é lícito ao poder público impor aos cidadãos por força, medo ou qualquer outro meio, que professem ou rejeitem determinada religião, ou impedir alguém de entrar numa comunidade religiosa ou dela sair. Muito mais é contra a vontade de Deus e os sagrados direitos da pessoa e da humanidade recorrer por qualquer modo à força para destruir ou dificultar a religião, quer em toda a terra quer em alguma região ou grupo determinado. Os limites da liberdade religiosa. 7. É no seio da sociedade humana que se exerce o direito à liberdade em matéria religiosa; por isso, este exercício está sujeito a certas normas reguladoras. No uso de qualquer liberdade deve respeitar-se o princípio moral da responsabilidade pessoal e social; cada homem e cada grupo social está moralmente obrigado, no exercício dos próprios direitos, a ter em conta os direitos alheios e os seus próprios deveres para com os outros e o bem comum. Com todos se deve proceder com justiça e bondade. Além disso, uma vez que a sociedade civil tem o direito de se proteger contra os abusos que, sob pretexto de liberdade religiosa, se poderiam verificar, é sobretudo ao poder civil que pertence assegurar esta proteção. Isto, porém, não se deve fazer de modo arbitrário, ou favorecendo injustamente uma parte, mas segundo as normas jurídicas, conformes à ordem objetiva, postuladas pela tutela eficaz dos direitos de todos os cidadãos e sua pacífica harmonia, pelo suficiente cuidado da honesta paz pública, que está na ordenada convivência sobre a base duma verdadeira justiça, e ainda pela guarda que se deve ter da moralidade pública. Todas estas coisas são parte fundamental do bem comum e pertencem à ordem pública. Deve aliás manter-se o princípio de assegurar a liberdade integral na sociedade, segundo o qual se há de reconhecer ao homem o maior grau possível de liberdade, só restringindo esta quando e na medida que for necessário. A educação para o exercício da liberdade. 8. Os homens de hoje estão sujeitos a pressões de toda a ordem e correm o perigo de se ver privados da própria determinação. Por outro lado, não poucos mostram-se inclinados a rejeitar, sob pretexto de liberdade, toda e qualquer sujeição, ou a fazer pouco caso da devida obediência. Pelo que este Concílio Vaticano exorta a todos, mas sobretudo aos que têm a seu cargo educar, a que se esforcem por formar homens que, fiéis à ordem moral, obedeçam à autoridade legítima e amem a autêntica liberdade; isto é, homens que julguem as coisas por si mesmos e à luz da verdade, procedam com sentido de responsabilidade, e aspirem a tudo o que é verdadeiro e justo, sempre prontos para colaborar generosamente com os demais. A liberdade religiosa deve, portanto, servir e orientar-se para levar os homens a proceder mais responsavelmente no desempenho dos seus deveres na vida social... ... Conclusão. 15. É, pois, manifesto que os homens de hoje desejam poder professar livremente a religião, em particular e em público, e que a liberdade religiosa se encontra já declarada como um direito civil na maior parte das Constituições, e solenemente reconhecida em documentos internacionais. Mas, embora a liberdade de culto religioso seja reconhecida na Constituição, não faltam regimes em que os poderes públicos se esforçam por afastar os cidadãos de professarem a religião e por tornar muito difícil e insegura a vida às comunidades religiosas. Saudando com alegria aqueles propícios sinais do nosso tempo, e denunciando com dor estes fatos deploráveis, o sagrado Concílio exorta os católicos e pede a todos os homens que ponderem com muita atenção a grande necessidade da liberdade religiosa, sobretudo nas atuais circunstâncias da família humana. Pois é patente que todos os povos se unem cada vez mais, que os homens de diferentes culturas e religiões estabelecem entre si relações mais estreitas, e que, finalmente, aumenta a consciência da responsabilidade própria de cada um. Por isso, para que se estabeleçam e consolidem as relações pacíficas e a concórdia no gênero humano, é necessário que, em toda a parte, a liberdade religiosa tenha uma eficaz tutela jurídica e que se respeitem os supremos deveres e direitos dos homens quanto à livre prática da religião na sociedade. Encontrando-se a liberdade religiosa diligentemente garantida na sociedade, queira Deus, Pai de todos os homens, que a família humana seja conduzida pela graça de Cristo e pela força do Espírito Santo à sublime e perene "liberdade da glória dos filhos de Deus" (Rm 8,21). Promulgação. Todas e cada uma das coisas que nesta Declaração se incluem, agradaram aos Padres do sagrado Concílio. E nós, pela autoridade apostólica que nos foi confiada por Cristo, juntamente com os veneráveis Padres as aprovamos no Espírito Santo, as decretamos e estabelecemos; e tudo quanto assim foi estatuído sinodalmente mandamos que, para glória de Deus, seja promulgado. Roma, junto de São Pedro, aos 7 de dezembro de 1965. Eu, PAULO, Bispo da Igreja Católica. (Seguem-se as assinaturas dos Padres Conciliares).".
"O grande desafio que se apresenta relativamente à questão sob exame é o de estabelecer o limite entre aquilo que o jurista Noberto Bobbio denomina de tolerância por boas razões e por más razões" (Aldir G. Soriano). A Declaração de Princípios sobre a Tolerância de 1995 esclarece que "a tolerância não é concessão, condescendência, indulgência. A tolerância é, antes de tudo, uma atitude ativa fundada no reconhecimento dos direitos universais da pessoa humana e das liberdades fundamentais do outro. Em nenhum caso a tolerância poderia ser invocada para justificar lesões a esses valores fundamentais. A tolerância deve ser praticada pelos indivíduos, pelos grupos e pelo Estado.".
Por todo o exposto, à luz das considerações supra tecidas, concluo pelo permissivo legal das pretensões daqueles que buscam a substituição de suas atividades acadêmicas ou profissionais, que deveriam ser realizadas aos sábados, por outras em dias ou horários diversos, esclarecendo, contudo que, a posição adotada não se dá para efeitos da dispensa das atividades que devem ser desempenhadas no sábado, mas no sentido de serem supridas as faltas, sempre levando-se em conta o interesse público e social e em busca de uma sociedade mais justa e permeável aos princípios de equilíbrio e igualdade.

Sobre o autor
Maurício Scheinman

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Sobre o texto:Texto inserido no Jus Navigandi nº712 (17.6.2005)Elaborado em 05.2005.Atualizado em 09.2007.
Informações bibliográficas:Conforme a NBR 6023:2000 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:SCHEINMAN, Maurício. Liberdade religiosa e escusa de consciência. Alguns apontamentos. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 712, 17 jun. 2005. Disponível em: . Acesso em:
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03 out. 200824 maio 2008.

A Evolução da Liberdade Religiosa como Direito Humano Universal

A Evolução da Liberdade Religiosa como Direito Humano Universal
Derek H. Davis

Nos anos após a Segunda Guerra Mundial, especificamente, a idéia de liberdade religiosa evoluiu até um direito humano internacional que todas as nações do mundo são obrigadas a proteger. No artigo a seguir, Derek Davis, diretor de Estudos entre Igreja e Estado da Universidade de Baylor no Texas e especialista em religião enquanto liberdade fundamental, discute os quatro pilares da liberdade religiosa internacional e como as obrigações dos tratados internacionais poderão ser mais plenamente implementadas.
O século XX presenciou progressos sem precedentes rumo à internacionalização dos direitos humanos religiosos. Realizou-se o Parlamento Mundial das Religiões em Chicago em 1893, como parte da Exposição de Colúmbia, evento esquecido há muito tempo mas importante na história religiosa do mundo. Um princípio fundador da reunião foi que nenhum grupo religioso deverá ser pressionado até sacrificar suas reivindicações de verdade. Em 1944, o Conselho Federal de Igrejas dos Estados Unidos criou a Comissão de Estudo das Bases de uma Paz Justa e Duradoura. A Comissão desenvolveu os "Seis Pilares da Paz", que mesclaram medidas táticas, tais como a "reforma dos tratados globais" e o "controle de estabelecimentos militares", com princípios tais como a "autonomia para crentes" e o "direito dos indivíduos de todas as partes à liberdade religiosa e intelectual". Outro grupo, a Comissão Norte-Americana das Igrejas sobre Questões Internacionais (CCIA), ajudou a promover a inclusão da liberdade religiosa na Declaração Universal de Direitos Humanos, adotada pelas Nações Unidas em 1948.
Além da Declaração Universal, três outros documentos internacionais significativos foram desenvolvidos no século XX com o propósito de promover princípios de liberdade religiosa: a Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (1966); a Declaração das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Intolerância e Discriminação com base na Religião ou Crença (1981); e o Documento Final de Viena (1989). Cada um desses documentos promove a liberdade religiosa ao expor os direitos de tal significado que deverão ser universais. Cada um desses documentos é descrito abaixo.
Os Quatro Pilares da Liberdade Religiosa Internacional
Dos quatro principais documentos internacionais que universalizaram o princípio da liberdade religiosa no século XX, o mais importante é, de longe, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pelas Nações Unidas em 1948. Esse documento histórico reconhece diversos direitos religiosos importantes. O Artigo 18 é o texto principal:
Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos.
A Declaração determina vigorosamente que as diferenças religiosas individuais devem ser respeitadas. Ela abraça o princípio político de que um papel fundamental do governo é o de proteger a escolha religiosa, e não ditar a conformidade religiosa. Levou séculos, até milênios, de guerras religiosas e perseguição religiosa para que a maior parte das nações-Estados modernas chegasse a essa posição, mas o princípio é agora amplamente aceito, especialmente no Ocidente. O princípio moderno de liberdade religiosa, através do qual os governos declaram sua neutralidade sobre questões religiosas, permitindo a cada cidadão individual, com base na sua própria dignidade humana, adotar suas crenças religiosas sem medo de represália, é conseqüência natural do esclarecimento. Ele recebeu reconhecimento universal na Declaração de 1948, sem dúvida o maior marco da evolução da liberdade religiosa internacional.
A Declaração refere-se a um "padrão comum de realização para todos os povos e nações". Escrita logo após os horrores indescritíveis da Segunda Guerra Mundial, ela fornece um padrão através do qual os povos do mundo podem aprender a viver em paz e cooperação. Caso o mundo goze de maior paz no atual milênio que nos anteriores, é possível que os historiadores do futuro olhem para 1948 como o início da nova era de paz, da mesma forma que olhamos agora, por exemplo, para o Edital de Milão de 313 como o início da união constantiniana entre Igreja e Estado, ou 1517 (apresentação das 95 Teses de Martinho Lutero) como o início da Reforma Protestante. Simplesmente não há forma de exagerar o significado da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Embora a Declaração tenha imposto obrigações morais a todas as nações signatárias, documentos posteriores a ampliaram ao criarem obrigações legais de cumprimento dos seus princípios amplos. A Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (1966), ratificada até o momento por 144 nações, proíbe a discriminação religiosa, conforme determinado no Artigo 2(1), "sem distinção de nenhum tipo, tal como raça, cor, sexo, idioma, política ou de opinião diferente, origem nacional ou social, propriedade, nascimento ou outra situação". O Artigo 18 garante os mesmos direitos relacionados no Artigo 18 da Declaração Universal e agrega mais, incluindo o direito dos pais dirigirem a educação religiosa dos seus filhos. O Artigo 20 proíbe o estímulo do ódio contra os demais devido à sua religião e o Artigo 27 protege os membros de minorias étnicas, religiosas ou lingüísticas para que não lhes seja proibido usufruir da sua própria cultura. Além disso, a Convenção de 1966 fornece definição ampla de religião que engloba religiões teístas e não teístas, bem como "credos raros e virtualmente desconhecidos".
A Declaração das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Intolerância e de Discriminação com base na Religião ou Crença, adotada em 1981, é outro documento fundamental que protege os direitos religiosos. Os Artigos 1 a 6 proporcionam relação abrangente de direitos relativos à liberdade de pensamento, consciência e religião. Estes incluem o direito de (1) culto ou reunião relativa a uma religião ou crença e estabelecimento e manutenção de lugares com esses propósitos; (2) estabelecer e manter instituições humanitárias ou beneficentes apropriadas; (3) fazer, adquirir e utilizar até um ponto adequado os artigos e materiais necessários e relativos aos rituais ou costumes de uma religião ou crença; (4) escrever, publicar e disseminar publicações relevantes nessas áreas; (5) ensinar religião ou crença em locais apropriados para esses fins; (6) solicitar e receber contribuições financeiras voluntárias e outras de indivíduos e instituições; (7) observar dias de repouso e celebrar dias sagrados e cerimônias de acordo com os preceitos de uma religião ou crença; e (8) estabelecer e manter comunicações com indivíduos e comunidades em questões de religião e crença em nível nacional e internacional.
Por fim, o Documento Final de Viena de 1989 contém disposições similares aos documentos de 1948, 1966 e 1981, exigindo respeito pelas diferenças religiosas, especialmente entre diversas comunidades de fé. As nações participantes concordam especificamente em assegurar "a implementação total e efetiva de pensamento, consciência, religião ou crença".
Esses documentos internacionais estão, na verdade, comprometendo apenas as nações que tomem medidas para dar-lhes situação legal. Em outras palavras, elas não são auto-executáveis. Embora as proteções à liberdade religiosa contidas nos documentos internacionais não possuam efeito de lei, elas já estão moldando a legislação de direitos humanos nas nações participantes e são característica fundamental de uma ordem mundial em desenvolvimento e, esperamos, mais pacífica. Entretanto, no mundo de hoje, a religião ainda é fonte de grande conflito e princípios fundamentais de liberdade religiosa são muitas vezes mais insultados que respeitados. Pode-se fazer mais para aumentar a liberdade religiosa?
Transformação das Obrigações Internacionais em Realidade
A perseguição religiosa continua a ser um problema sério, apesar das medidas significativas tomadas pela comunidade mundial para combatê-la, particularmente desde a Segunda Guerra Mundial, sinal moderado de que as declarações, convenções e outros documentos não se traduzem facilmente em realidade. Acadêmicos destacaram pelo menos quatro áreas nas quais as abordagens institucionais podem ser eficazes no auxílio para tornar a liberdade religiosa não apenas um ideal mundial, mas também uma realidade mundial.
Implementação de tratados. As nações devem levar a sério as disposições de tratados de direitos humanos internacionais, integrando-os em seus próprios sistemas legais. É talvez repetitivo afirmar que a liberdade religiosa no mundo seria uma dádiva se todos os países do mundo cumprissem com as diversas Convenções e outros documentos que vêm sendo adotados desde a Segunda Guerra Mundial. Isso não reflete o fato de que muitos governos se dão ao luxo de dormir sobre os louros dos ideais que assinaram, enquanto deixam de adotar as ações legais e outras necessárias para torná-las realidade.
Legislação. Os governos em todo o mundo deverão promulgar legislação significativa projetada para conter a perseguição religiosa. Em 1998, o Congresso norte-americano aprovou a Lei da Liberdade Religiosa Internacional. Essa Lei exige um relatório anual preparado pelo Departamento de Estado que determina e descreve as violações de liberdade religiosa em cada país. O Departamento também considera as sugestões de uma Comissão Norte-Americana sobre Liberdade Religiosa Internacional, de nove membros. Com base no relatório anual, o presidente dos Estados Unidos pode impor uma série de penalidades e sanções a países considerados violadores. A legislação é controversa internacionalmente, mas a medida até agora ajudou a causa da liberdade religiosa internacional. A lei não tenta impor o "modo norte-americano" a outras nações. Ao contrário, ela conta com a crença aceita universalmente na dignidade inviolável de todos os seres humanos e nos direitos universais que surgem dessa crença. Educação. Mais necessita ser feito para conscientizar os povos do mundo sobre o nível impressionante de perseguição religiosa que ainda prevalece em muitas partes do mundo. Mais conferências e simpósios poderão destacar este tema e mais apoio (verbal e monetário) poderá ser fornecido a organizações não-governamentais de direitos humanos, tais como a Human Rights Watch e a Associação para a Liberdade Religiosa Internacional, que acompanham abusos de direitos humanos em todo o mundo e os relata a governos e outros grupos interessados.
Separação entre Igreja e Estado. Deve haver esforços renovados para aumentar o respeito por todas as instituições políticas, religiosas e sociais para a visão moderna de que os principais interesses da sociedade política estão no incentivo à paz, justiça, igualdade e liberdade, não em fazer avançar a religião. Este é o significado básico da separação entre Igreja e Estado. A tensão óbvia aqui é que, historicamente, a religião vem sendo a base de todas as dimensões da vida, incluindo as políticas. Como observou o eminente quacre William Penn em 1692, "o governo parece ser uma parte da própria religião, algo de sagrado na sua instituição e propósito". Naturalmente, Penn era um notável separacionista entre Igreja e Estado e moveu-se cada vez mais para a visão de que a religião é fundamentalmente uma preocupação pessoal e individual, e que o papel do governo deverá ser a proteção de todas as visões religiosas em vez da defesa de uma. Desde os dias de Penn, os Estados-nações vêm adotando cada vez mais essa perspectiva e os documentos de direitos humanos do século XX fizeram o mesmo. Conforme já sugerido, essa perspectiva necessita ser ensinada por instituições educacionais, através de uma série de currículos que confrontem a interação entre religião e governo no mundo moderno. Na análise final, nós, como membros da comunidade mundial, devemos a nós e aos nossos descendentes tornar a liberdade religiosa uma liberdade para todos. Não há tarefa mais importante neste início do século XXI.

Intolerância Religiosa e o Futuro da Humanidade

Intolência religiosa e o futuro da humanidade.
Ricardo Gondim
Proponho trégua entre as religiões. Chega de incompreensão. Basta de sangue derramado em nome de Deus. Vamos entupir os fuzis dogmáticos com flores. Transformemos nossos tanques teológicos em tratores. Se crer gera amor e ódio com a mesma intensidade, concentremos nossas forças na ternura.
Será possível um rascunho de paz religiosa, mesmo provisória? Sim, a Grande Utopia escatológica de um só Pastor e um só Rebanho pode ser alinhavada em pequenos gestos. O futuro será o resultado de mínimas decisões presentes. Urge pressa. Não há mais volta, o planeta encolheu do tamanho dum vilarejo. Os desequilíbrios ecológicos locais repercutem globalmente e as decisões econômicas nacionais produzem desdobramentos mundiais.
Os teóricos da religião precisam se conscientizar que vivem em sociedades complexas; é preciso conviver com os diferentes Os credos já não representam etnias ou culturas locais. Cada dia se tornará mais necessário entender o significado da tolerância. Qualquer intransigência religiosa pode desencadear uma guerra, com poder de destruição comparável a um conflito atômico.
Algumas mudanças precisam acontecer urgentemente entre as religiões mundiais.
Que pastores, sacerdotes, rabinos e mulás dediquem mais tempo lendo, decorando e declamando poesia, e para prevenir preconceitos, que se omitam os autores. Assim, poderão saborear beleza sem distinguir entre ateus e crentes, devassos e santos; que teólogos se especializem em "agapeologia"; que solidariedade seja a melhor prece, e exemplo, o maior sermão.
Que as religiões, grandes e pequenas, se concentrem na vida aqui no mundo; que busquem aliviar os cansados e oprimidos antes de prometerem salvação eterna; que visitem os doentes, antes de tentarem decodificar os mistérios da Divindade; que defendam o direito do órfão e da viúva, antes de se arvorarem únicos detentores da verdade; que aprendam a zelar pela vida e desprezem as taxas de crescimento de suas instituições; que a mão esquerda desconheça as virtudes praticadas pela direita e não usem a bondade como proselitismo; e que Deus seja percebido no rosto do próximo e não em livros, compêndios, altares ou imagens.
Que os líderes eclesiásticos voltem a caminhar na beira da praia; que façam estágio na casa de um pescador artesanal; que acordem cedo, sintam o aroma do café preto, naveguem todo o dia e na boquinha da noite voltem para casa exaustos; que suas mãos calejadas lhes ensinem a manter o coração sensível; que o corpo doído lhes amorteça a ganância; que se deitem felizes numa rede, e embalados pela bruma, voltem a soletrar con-ten-ta-men-to.
Que as liturgias dos templos imitem as brincadeiras infantis onde ninguém é dono de nada, nenhum projeto definitivo, e não se separam as pessoas entre líderes e liderados. Já que o Reino Eterno não é dos adultos, mas dos pequeninos desprovidos de amarguras, que os ritos busquem devolver a humanidade aos jardins-de-infância; que os bancos das igrejas sejam transformados em gangorras e balanços; que o culto vire festa.
Devo estar delirando, mas entre alucinar bobagens e permitir que a realidade se transforme em pesadelo, prefiro continuar um sonhador.
Soli Deo Gloria
[Notícia n.º 2912, inserida em 2006-02-10, lida 189 vezes.]

www.portalevangelico.pt
2/2/2007 17:16:21

sábado, 6 de setembro de 2008

A filosofia Adventista da Educação


A FILOSOFIA ADVENTISTA DA EDUCAÇÃO

A Educação Adventista considera a Bíblia como a fonte ao auto revelação de Deus e aceita como fundamentos básicos da visão bíblica cristã os seguintes aspectos:• a existência de um Deus Criador; a criação do Universo perfeito e do ser humano à imagem de Deus com livre-arbítrio;• o surgimento do pecado a partir da rebelião de Lúcifer; a queda do ser humano em pecado e a perda parcial da imagem de Deus;• a inabilidade do ser humano de restaurar a própria natureza sem o auxilio divino;• a iniciativa de Deus para a restauração do ser humano através do nascimento, vida, morte e ressurreição de Jesus Cristo; • a ação do Espírito Santo no plano da restauração da imagem de Deus na humanidade; • o retorno de Cristo para pôr fim à história terrestre em sua fase de pecado; a restauração do mundo e dos seres humanos à sua condição original.Mediante tal fundamento bíblico-cristão, a Educação Adventista também se coloca diante das grandes questões filosóficas no tocante aos aspectos antropológicos, epistemológicos e, conseqüentemente, educacionais da existência humana.

NATUREZA HUMANA


Na Educação Adventista, o ser humano não deve ser visto a partir de uma perspectiva evolucionista, mas sim pela ótica criacionista.
OrigemO essencial a respeito da natureza humana numa perspectiva bíblica, é que “Deus criou o homem à Sua imagem”, com o direito de fazer escolhas (Gên. 1 :27). Assim o ser humano não é um animal altamente desenvolvido, mas um indivíduo que compartilha da natureza e caráter divinos; um ser que deve ser entendido sob o ponto de vista de Deus, e não apenas pelas suas faculdades físicas e racionais.
“Quando Adão saiu das mãos do Criador, trazia ele em sua natureza física, intelectual e espiritual, a semelhança de seu Criador. (...) Todas as suas faculdades eram passíveis de desenvolvimento; sua capacidade e vigor deveriam aumentar continuamente” (White, 1996ª:15).
QuedaCom a entrada do pecado a natureza humana foi modificada. A humanidade rejeitou a Deus escolhendo seu próprio cami;nho. Assim, a imagem divina, atribuída aos seres humanos na criação, foi corrompida em todos os seus aspectos, e sua nature;za se tornou pecaminosa. Desde então as pessoas começaram a enfrentar um grande conflito interno e externo, entre as forças do bem e do mal, entre o desejo de fazer o bem (bondade) e a inclinação para o mal (maldade).
Com o pecado a semelhança divina se deslustrou, obliterando-se quase. Enfraqueceu a capacidade física de homem e sua capacidade mental diminuiu; ofuscou-se-lhe a visão espiritual. (...)Pela transgressão, o homem ficou privado de aprender de Deus, mediante a comunhão direta, e, em grande parte, mediante as Suas obras. Com faculdades enfraquecidas e a visão restrita, tornou-se incapaz de interpretar corretamente. Por misturar o mal com o bem, sua mente se tornou confusa e entorpecidas suas faculdades mentais e espirituais (White, 1996ª:15,17).
DestinoA humanidade, entretanto, não foi deixada sem esperança. Deus em Seu infinito amor e misericórdia, tomou a iniciativa para renovar e restaurar Sua imagem nos seres humanos. Foi concebido o plano da salvação, através do sacrifício de Jesus Cristo.
Restaurar no homem a imagem de seu Autor, levá-lo de novo à perfeição em que fora criado, promover o desenvolvimento do corpo, espírito e alma para que se pudesse realizar o propósito divino da sua criação – tal deveria ser a obra da redenção. Este é o objetivo da educação, o grande objetivo da vida (White, 1996ª:15-16).


EPISTEMOLOGIA CRISTÃ


A epistemologia se refere ao modo como uma pessoa adquire conhecimento. Esta é uma das questões fundamentais da existência humana. Para a Educação Adventista, o conhecimento verdadeiro tem sua origem na fonte de toda sabedoria — Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo - e na revelação feita através de Jesus Cristo, das Sagradas Escrituras, da natureza e da iniciativa divina de colocar no ser humano uma abertura para o transcendente que lhe permite ouvir o chamado de Deus. Para conhecer a Deus é necessário ter comunhão com Deus. Nessa comunhão, o agente que opera na mente humana é o Espírito Santo, pois exerce impressões que contribuem no processo de aquisição do conhecimento e de transformação do caráter.A Bíblia é a maior fonte de conhecimento e, portanto, a base de autoridade epistemológica. Todas as outras fontes de saber de;vem estar relacionadas às Escrituras Sagradas, que provêem à inte;gração necessária do currículo numa perspectiva cristã.A Bíblia deve ser o grande educador em cada sala de aula, pois é impossível estudar suas páginas sem ter o intelecto disciplinado, enobrecido, purificado e refinado. A Palavra de Deus deve ocupar o lugar do mais alto livro educativo e deve ser tratada com reverência.Outra fonte de conhecimento de muita importância para a Educa;ção Adventista é a natureza, com a qual o ser humano entra em conta;to através da vida cotidiana e do estudo científico. Foi em relação dire;ta com a natureza e todas as obras criadas que Jesus se desenvolveu.
Aquele que fizera todas as coisas estudou as lições que Sua pró;pria mão escrevera na terra, no mar e no céu. [...] Adquiriu da natureza acumulados conhecimentos científicos. Estudava a vida das plantas e dos animais bem como a dos homens. [...] Encontrava recursos na natureza; novas idéias de meios e modos brotavam-lhe da mente, ao estudar a vida das plantas e animas. (...) Assim se revelava a Jesus o significado da Palavra e das obras de Deus, ao buscar compreender a razão das coisas (Whi;te, 2000b: 50, 51)
Segundo Knight (2001: 18]), “o estudo da natureza certamen;te enriquece o entendimento humano de seu ambiente. Também for;nece respostas para algumas das muitas questões que não são tra;tadas na Bíblia”. Entretanto, é preciso lembrar que existem proble;mas na interpretação do mundo natural, porque toda a criação foi afetada pela queda e entrou em degeneração. Por isso, as desco;bertas científicas advindas ao Livro da natureza devem ser interpretadas à luz da revelação bíblica.A racionalidade humana também constitui uma fonte epistemológica. A humanidade, que foi criada à imagem de Deus, é racional em sua essência. Os seres humanos foram feitos para pensar de forma abstrata e reflexiva, raciocinando da causa para o efeito. Assim, a razão humana é um aspecto essencial no tocante ao ato de conhecer. Ajuda a compreender a verdade e a expandir o conhecimento. Entretanto, não é o elemento epistemológico básico. As descobertas da razão também devem ser verificadas e aplicadas conforme as escrituras.
Na epistemologia cristã, é preciso ter clareza de que a Bíblia é a base do entendimento nos diversos campos de estudo e que estes em contrapartida, iluminam o sentido das Escrituras. Deus Se apresentou através da Bíblia e da natureza, e podemos conhecer os diferentes aspectos da vida através da razão, que Ele concedeu aos seres humanos. Nesse sentido, o conhecimento se dá através das relações interacionais, ou seja, pela relação da pessoa com o seu semelhante, com a natureza, com a sua maneira de pensar e, principalmente, com Deus.Por isso, a produção do conhecimento secular deve estar anco;rada no conhecimento verdadeiro. Todos os que exercem a função de mediadores entre o educando e o objeto do conhecimento pre;cisam valorizar as interações sociais, pois aguçam as capacidades mentais e oportunizam a reflexão pessoal.


A EDUCAÇÃO ADVENTISTA


A educação cristã, na concepção Adventista, é vista como uma atividade redentora. O educando é considerado num todo, pois a pessoa inteira é importante para Deus. Por isso, o objetivo da Edu;cação Adventista é a restauração no ser humano, à imagem de Deus, em seus aspectos físicos, intelectuais sociais e espirituais.
Alunos na perspectiva cristã devem ser vistos como crianças de Deus. Cada uma é um receptáculo da imagem de Deus e alguém por quem Cristo morreu. Cada um portanto tem possibilidades infinitas e eternas, o valor de cada aluno individualmente só pode ser compreendido nos termos do preço pago por sua restauração na cruz do calvário (Knight 2001: 209).
Nesse contexto, o educador cristão não deve ser apenas um expositor da verdade, mas uma pessoa especial que tem grande cuida;do pelos educandos sob sua responsabilidade. Alguém que reconhece, respeita a individualidade e valoriza o potencial de cada educando. Deve ser aquele que não só detém o conhecimento acumulado historicamente pela humanidade, mas que sabe estar por detrás deste agente mais que humano. Deve conhecer a Deus por experiên;cia própria e ter consciência de que o conhecimento humano não é algo acabado e que nossa mente é finita. Em seu fazer pedagógico cria condições para que o educando se aproprie do conhecimento que faz parte do patrimônio cultural da humanidade de forma socializada e contextualizada ao conhecimento verdadeiro.O currículo enfatiza uma integração equilibrada entre os aspec;tos espirituais, mentais, físicos e sociais a fim de contribuir para a restauração da imagem e semelhança de Deus no ser humano. Precisa desenvolver a pessoa por completo. Nesse currículo a Bíblia é o documento fundamental e contextual. Segundo Knight (2001: 239), “devemos reconhecer que não há nada neutro em nosso programa de atividades. Todas as nossas atividades são refreadoras e restauradoras ou diversivas e destrutivas. A Bíblia é um critério primário para nos ajudar a tomar decisões em todos os aspectos da educação cristã (...), é o foco de integração para todo o conhecimento, pois fornece uma perspectiva unificadora que vem de Deus, a origem de toda verdade”.A metodologia, por sua vez, prioriza a parceria do divino com o humano através de práticas que despertem o desejo de aprender, estimulando o espírito de investigação e relacionando a teoria com a prática na construção do conhecimento.A avaliação, na perspectiva cristã, é a intervenção positiva no processo pedagógico, sustentada pela reflexão sobre a prática. Tal reflexão ocorre quando educador e educando conhecem os acertos e erros, encontros e desencontros ocorridos na prática educativa, com o objetivo de retomar o rumo para alcançar os objetivos propostos. Ressaltam-se, portanto, as relações interacionais (homem - Deus - comunidade - natureza). Só assim o educando reco;nhecerá os elementos que o distinguem como ser humano, projetado por Deus para uma interação com seus semelhantes.Deus olha o interior da pequenina semente que Ele próprio criou, e nela vê encoberta a bela flor, o arbusto ou a grande e frondo;sa árvore. Assim vê Ele as possibilidades em toda a criatura hu;mana. Achamo-nos aqui para determinado fim. Deus nos deu o plano que tem para a nossa vida, e deseja que alcancemos a mais alta norma de desenvolvimento (White 1997a: 397).


FINS E PRINCÍPIOS NORTEADORES


MISSÃO


Promover, através da educação cristã, o desenvolvimento harmônico dos educandos, nos aspectos físicos, intelectuais, sociais e espirituais, formando cidadãos pensantes e úteis à comunidade, à pátria e a Deus.


VISÃO


Ser um sistema educacional reconhecido pela excelência, fundamentado em princípios ético-cristãos, com ampla participação no setor educacional.
OBJETIVOS DA EDUCAÇÃO ADVENTISTAA Educação Adventista compreende o processo educativo para além de um certo curso de estudos. “Significa mais do que a prepa;ração para a vida presente. Visa o ser todo, e todo o período da exis;tência possível do homem. É o desenvolvimento harmônico das facul;dades físicas, mentais e espirituais. Prepara o estudante para o gozo ao serviço neste mundo e para aquela alegria mais elevada por um mais dilatado serviço no mundo vindouro” (White, 1996a:13).Partindo do pressuposto de que o ser humano necessita ser restaurado a seu estado original de perfeição, a Educação Adven;tista se propõe a alcançar os seguintes objetivos:
a) Promover o reconhecimento de Deus como fonte de toda sabedoria. “Todo saber o desenvolvimento real têm sua fonte no conhecimento de Deus” (White, 1996a: 14).b) Reconhecer e aplicar a Bíblia como referencial de conduta. “O ensino da Bíblia deve ter os nossos mais espontâneos pensamentos, nossos melhores métodos, e o nosso mais fervoroso esforço” (White, 1996a:186).c) Estimular o estudo, a proteção e a conservação da natureza criada por Deus. “ O livro da natureza é um grande compêndio que devemos usar em conexão com as Sagradas Escrituras para ensinar a outros sobre Seu caráter e reconduzir ovelhas ao redil de Deus. (...) Em si mesmo o encanto da natureza desvia a alma, do pecado e das atrações mundanas, para a pureza, para a paz e para Deus (White, 1997c: 24).d) Incentivar a utilização das faculdades mentais na aquisição e construção do conhecimento em favor do bem comum, tendo como ferramenta as diferentes fontes de informação e recursos tecnológicos. “O intelecto humano precisa expandir-se, e adquirir vigor, agude;za e atividade. (...) A mente deve idear, trabalhar e esforçar-se a fim de dar solidez e vigor ao intelecto” (White, 1996b: 226). “A mente humana quer ter ação. Se não estiver ativa, na reta di;reção, será ativa no erro” (White, 1989:1:51).e) Promover a aquisição de hábitos saudáveis através do conheci;mento do corpo e das leis que o regem. “As leis que governam nosso organismo físico, Deus as escreveu so;bre cada nervo, músculo ou fibra do corpo. Cada violação des;cuidada ou negligente destas leis constitui um pecado contra o nosso Criador (...) Um conhecimento da fisiologia e higiene deve ser a base de todo esforço educativo (White, 1996a: 196, 197). Os que estão recebendo o preparo para o serviço, sofrem gran;de perda quando não adquirem conhecimento de como prepa;rar o alimento de maneira que seja ao mesmo tempo saudável e saboroso (White, 2000a. 312).f) Oportunizar o desenvolvimento do senso crítico, da criatividade da pesquisa e do pensamento reflexivo. “As verdades da divina Palavra podem ser melhor aprendidas pelo cristão intelectual. Cristo pode ser glorificado melhor por aqueles que O servem com inteligência” (White, 2000a: 361).g) Incentivar o desenvolvimento dos deveres práticos da vida diária, a sábia escolha profissional, a formação familiar, o serviço a Deus e à comunidade. “Os estudantes devem, enquanto na escola, ser despertados de suas sensibilidades morais no que respeita a ver e sentir os direitos que a sociedade tem sobre eles, e que devem viver em obediência às leis naturais, de modo a poderem, por sua vida e influência, por preceito e exemplo, ser para essa sociedade proveito e bênção (White, 2000a: 84).O trabalho manual útil faz parte do plano evangélico. (...) Cada um deve adquirir conhecimentos em algum ramo de trabalho manual que, em caso de necessidade, lhe possa proporcionar um meio de vida. Isso é essencial, não somente como salvaguarda contra as vicissitudes da vida, mas em virtude de seu efeito sobre o desenvolvimento físico, mental e moral (White, 2000a: 307).h) Promover a autonomia e a autenticidade ancorados nos valores bíblico-cristãos. Ao sacrificar o estudante a faculdade de raciocinar e julgar por si mesmo, torna-se incapaz de discernir entre a verdade e o erro e cai fácil presa do engano. É facilmente levado a seguir a tradição e o costume” (White,1996a:230).i) Favorecer o desenvolvimento da auto-estima positiva, do sentimento de aceitação e de segurança. “Tanto quanto possível, deve cada criança ser ensinada a ter con;fiança em si mesma. Pondo em exercício as várias faculdades, aprenderá onde é mais forte e em que é deficiente. O instrutor sábio dará especial atenção ao desenvolvimento dos traços mais fracos, para que a criança possa formar um caráter bem equili;brado e harmonioso (White, 1996b: 57).j) Resgatar a prática da regra áurea nos relacionamentos interpes;soais, que é amar ao próximo como a si mesmo. “Toda criança deve ser ensinada a ser delicada, compassiva, amável, piedosa, cortês e de coração terno” (White 2000b: 143). A cooperação deve ser o espírito da sala de aulas, a lei de sua vida. [...] Isto fomentará o respeito próprio e o desejo de ser útil. Valioso seria aos jovens, aos pais, aos professores, estudarem as lições de cooperação que encontramos nas Escrituras (White, 1996: 285, 286)

PEDAGOGIA ADVENTISTA

METODOLOGIA

A metodologia de ensino e aprendizagem da Educação Adventista pauta-se pelas concepções filosóficas e pelos objetivos a que se propõe, conforme o pensamento hebraico-oriental e o modelo de Jesus, o Mestre por excelência.
Isso não significa que o educador terá um modelo de ensino, pois cada um possui habilidades próprias e para cada realidade educacional existem praticas diversas, costumes e idéias produzidos socialmente. Como afirma Durkheim (1978: 39), “não há povo em que não exista certo número de idéias, sentidos e praticas que a educação deve inculcar a todas as crianças indistintamente, seja qual for a categoria social a que pertençam”. Entretanto, existe uma base metodológica comum que sustenta e promove a unicidade e identidade da instituição educacional.
Nessa perspectiva, toda prática pedagógica deve estar amparada por princípios que a norteiem. Desse modo, o educador que apreende os princípios tem a possibilidade de os transferir para outras situações no cotidiano.

Princípios Metodológicos

Os seguintes princípios metodológicos servem como base comum para as praticas curriculares nas unidades escolares adventistas:

a) Integração fé e ensino


Ao integrar fé e ensino, educador e educando são levados a refletir sobre todos os aspectos da realidade, numa perspectiva cristocêntrica. A integração fé e ensino não pode ser fruto do acaso; ao contrario, deve ser um processo intencional sistemático. Todas as atividades educativas deveriam partir de uma perspectiva bíblico-cristã. O objetivo é levar os alunos a internalizar voluntariamente uma visão da vida orientada para o serviço, motivada pelo amor e voltada para o reino eterno de Deus.
Para isso, é preciso que o educador adventista se consagre diariamente a Deus e esteja consciente da missão delineada na cosmovisão bíblico-adventista.

b) Estimulo ao espírito de investigação, reflexão e criatividade


O educando possui naturalmente um espírito inquiridor a respeito da vida e do funcionamento do mundo. Cabe ao educador estimulá-lo e orientá-lo a procurar respostas para suas indagações, através de instrumentos como a pesquisa, e despertar o espírito investigativo através de reflexões a respeito das diversas situações da vida humana.
A palavra “pesquisa” aqui deve ser entendida como um instrumento que propicia a construção do conhecimento e não como uma mera consulta de dados prontos e acabados. O educador deve primar por uma investigação que estimule o raciocínio, a reflexão e a criatividade. Assim, não colocará a mente do educando sobre seu controle, mas contribuirá para o desenvolvimento da autonomia intelectual.

Os professores devem induzir os alunos a pensar, e a entender claramente a verdade por si mesmos. Não basta ao professor explicar, ou ao aluno crer; cumpre despertar o espírito de investigação, e o aluno ser atraído a enunciar a verdade em sua própria linguagem, tornando assim evidente que lhe vê a força e faz a aplicação (White, 1994: 140).

c) Conhecimento da realidade do educando como ponto de partida


É imprescindível que o educador conheça a realidade do educando, no seu contexto social, e como se processa o seu desenvolvimento físico, emocional e intelectual. Ao introduzir qualquer tema ou assunto, precisa obter informações relevantes ao contexto do educando, propondo situações, problemas e desafios que permitam a elaboração de hipóteses, a realização de experimentos e a construção de analogias, relacionando as partes ao todo. Tal postura contribuirá para o ânimo do educando em sua trajetória estudantil e para a elaboração e compreensão de questões mais amplas.

Em seus ensinos, tirava Cristo ilustrações do grande tesouro dos laços e afeições de família, bem como da natureza. O desconhecido era ilustrado pelo conhecido; sagradas e divinas verdades, pelas coisas naturais e terrestres, com as quais o povo se achava mais familiarizado (White, 2000a: 178).

d) Relação teoria-prática


Teoria e prática não são, na concepção adventista, duas fases, mas elementos de um círculo harmonioso. Aprende-se fazendo, faz-se aprendendo.
O educador precisa ter em mente a importância da aplicabilidade dos temas estudados em sala de aula. O conhecimento teórico sem o conhecimento prático quase nada contribui para o sucesso do educando.
O trabalho prático desperta observação minuciosa e pensamento independente. Não é produtivo se deter no ensino de conceitos quando estes estão ligados às questões cotidianas, como se comunicar com fluência, ler e escrever com clareza e coesão, saber preparar alimentos saudáveis, fazer com precisão as contas dos próprios gastos.

[Quando esteve na Terra,] Jesus não tratou de teorias abstratas, mas daquilo que é essencial ao desenvolvimento do caráter, que ampliará a capacidade humana quanto ao conhecimento de Deus, e lhe aumentará o poder de fazer o bem (White, 2000a: 34-35).

e) Interação afetiva


A relação afetiva é um dos aspectos educativos de vital importância. Pela conquista do coração se obtêm a amizade e se contribui para uma auto-estima positiva, essencial ao crescimento da personalidade. Desenvolve-se, assim, o sentimento de aceitação, segurança e inter-relacionamento com os semelhantes.

Os professores muitas vezes deixam de entrar suficientemente em relação social com seus alunos. Manifestam pouca simpatia e ternura, e demasiada dignidade de um juiz austero. Conquanto o professor tenha de ser firme e decidido, não deve ser opressor e ditatorial. Ser áspero e severo, ficar longe de seus discípulos, ou tratá-los indiferentemente, corresponde a fechar a passagem pela qual poderia influir neles para o bem (White, 1996a: 280).

f) Ensino de valores


Segundo Knight (2001: 240, 241), toda experiência educacional é repleta de valores. A axiologia deve permear o currículo escolar e influenciar um viver coerente com os princípios básicos da ética crista e da valorização do educando como individuo e como membro de uma comunidade, com responsabilidades e direitos em relação ao meio ambiente, à vida e à família.

A verdadeira educação não desconhece o valor do conhecimento cientifico ou aquisições literárias, mas acima da instituição aprecia a capacidade, acima da capacidade a bondade, e acima das aquisições intelectuais o caráter. O mundo não necessita tanto de homens de grande intelecto, como de nobre caráter. Necessita de homens cuja habilidade seja dirigida por princípios firmes (White, 1996a: 225).

g) Respeito à unicidade do educando


O educador cristão deve reconhecer e respeitar a individualidade, unicidade e valor em cada pessoa. Em seu relacionamento com os discípulos e com a população em geral, Jesus respeitava a individualidade e valorizava as pessoas.
O respeito à individualidade não deve negar a importância do grupo. Paulo, escrevendo aos coríntios a respeito dos dons espirituais, ressaltou o valor do todo social assim como o valor único de cada pessoa (I Cor. 12: 12-31). O corpo (grupo social) tem saúde quando a unicidade dos membros é respeitada. A sala de aula não deve ressaltar o individualismo, mas o respeito pela individualidade e pelo grupo.

Em todo verdadeiro ensino o elemento pessoal é essencial. Cristo, em Seu ensino, tratava com os homens individualmente. Foi pelo trato e convívio pessoal que Ele preparou os doze [discípulos]. Era em particular, e muitas vezes a um único ouvinte, que dava Suas preciosas instruções. [...] O mesmo interesse pessoal, a mesma atenção para com o desenvolvimento individual são necessárias na obra educativa hoje. Muitos jovens que aparentemente nada prometem, são ricamente dotados de talentos que não aplicam a uso algum. [...] O verdadeiro educador, conservando em vista aquilo que seus discípulos podem tornar-se, reconhecerá o valor do material com que trabalha. Terá um interesse pessoal em cada um de seus alunos, e procurará desenvolver todas as suas faculdades. Por mais imperfeitos que sejam eles, acoroçoará [ou incentivará] todo o esforço por conformar-se com os princípios retos (White, 1996a: 231-232).

h) Espírito cooperativo


A Bíblia reforça a importância da convivência social. Portanto, o espaço escolar deve proporcionar relações de cooperação com excelente oportunidade para o desenvolvimento continuo do conhecimento e da formação do caráter. Trabalhos em grupo, envolvimento em projetos de auxilio à comunidade e participação ativa dos educandos no apoio aos seus pares são algumas das alternativas aplicáveis a este principio.

A cooperação deve ser o principio da sala de aluas, a lei de sua vida. O professor que adquire a cooperação de seus discípulos consegue um auxilio inapreciável [ou imprescindível] na manutenção da ordem (White, 1996a: 285).

i) Interdisciplinaridade


A inter-relação entre os conteúdos nas diferentes disciplinas contitui-se o foco da interdisciplinaridade. Não podemos conceber um modelo educativo que fragmente a relação que a própria vida faz de seus conteúdos no dia-a-dia. A educação adventista oferece uma relação epistemológica entre as disciplinas para que os diversos saberes se construam de maneira harmônica.

Não é bom sobrecarregar a mente de estudos que exigem intensa aplicação, mas que não são introduzidos na vida prática. Tal educação será prejudicial ao estudante. Pois esses estudos diminuem o desejo e a inclinação para aqueles outros que o habilitariam a ser útil, e o tornariam capaz de se desempenhar de suas responsabilidades. Um preparo prático é muito mais valioso de que qualquer soma de teoria. Não é mesmo suficiente possuir conhecimento. Precisamos ter habilidade para os empregar devidamente (White, 2000a: 387).

j) Preparo para servir


O serviço é um elemento essencial através do qual “Deus busca curar a alienação entre as pessoas, que se desenvolveu em conseqüência da queda” (Knight, 2002:214). Nessa perspectiva, um dos objetivos primordiais da Educação Adventista é o serviço a outros, não entendido como subserviência nem como humanitarismo altruísta, mas como essência do amor cristão e caráter semelhante ao de Cristo (Knight, 2002: 216). Tal educação se propõe a oportunizar situações para que os educandos sirvam aos semelhantes em suas respectivas comunidades.

Cristo ligou os homens ao Seu coração pelos laços da dedicação e do amor; e pelos mesmos laços ligou-os a seus semelhantes. Para Ele o amor era a vida, e a vida era o serviço em prol de outrem (White, 1996a: 80).

Orientações Didático-metodológicas

O trabalho pedagógico deve abranger atividades diversificadas envolvendo todas as áreas do currículo, conforme os objetivos apresentados anteriormente. As atividades escolhidas, sejam individuais ou coletivas, precisam estar em consonância com os princípios metodológicos elencados e com o projeto educacional de cada Unidade Escolar.
Os coordenadores pedagógicos e docentes deverão analisar orientações aqui colocadas como possibilidades concretas e desejáveis à prática curricular no contexto da Educação Adventista, tendo em vista que “é preciso agir com critérios definidos e com prudência. Não basta relacionar qualquer coisa num planejamento. Há necessidade de estudar que procedimentos e que atividades possibilitarão, da melhor forma, que nossos alunos atinjam o objetivo de aprender o melhor possível daquilo que estamos pretendendo ensinar” (Luckesi, 1993: 105).

Os professores podem aprender uma lição do incidente do fazendeiro que pôs a comida das ovelhas em uma manjedoura tão alto que as menores do rebanho não a podiam alcançar. Alguns mestres apresentam a verdade aos alunos de maneira semelhante. Põem tão alto a manjedoura, que aqueles a quem ensinam não podem alcançar o alimento. Esquecem-se de que os alunos possuem apenas uma parte da oportunidade que eles têm tido para obter o conhecimento de Deus (White, 2000a: 435).

Partindo dessas considerações, o espaço da sala de aula deve ser organizado de maneira que possibilite ao educando se locomover livremente, considerando seus interesses e necessidades, proporcionando o desenvolvimento da linguagem oral, da socialização e do espírito de cooperação.
É importante que o educador perceba que o pátio da escola, a biblioteca, o auditório e a sala de artes, entre outros lugares, também são espaços educativos para explorar o lúdico, a historia de vida, os saberes do mundo contemporâneo, a criatividade, a leitura, a escrita. Em todos esses espaços, o educador pode utilizar inúmeras ilustrações, objetos e figuras que estejam direta ou indiretamente relacionados ao tema de estudo. Ao fazer uso de tais recursos, desperta a atenção e a curiosidade de seus educandos, proporcionando o seu envolvimento com a temática a ser trabalhada.

Mediante o uso de figuras e símbolos, as lições dadas eram assim ilustradas e gravadas mais firmemente na memória. Por meio desse conjunto de imagens animadas, a criança era iniciada, quase desde a infância, nos mistérios, na sabedoria e nas esperanças dos pais e guiadas num modo de pensar, sentir e prever que alcançava muito mais além do visível e transitório; até o invisível e eterno (White, 2000b: 19).

No contexto da sala de aulas, o educador precisa ser surpreendente como Jesus era. Os discípulos e a multidão jamais sabiam o que ia acontecer no decorrer de Seus ensinamentos. Dessa forma, o Mestre impressionava a mente de Seus discípulos fazendo-os gravar na memória o que era realmente importante.
A vida tem uma relação fundamental com a memória. Uma não faz sentido sem a outra. Quando esta é construída com significado, a aprendizagem é arquivada, por assim dizer, nos espaços intrincados e fascinantes do cérebro humano.

Embora a memória possa ser deficiente a principio, há de crescer em força mediante exercício, de maneira que, depois de algum tempo, vos será um prazer entesourar as preciosas palavras da verdade. E o habito prover-se-á um valioso auxilio ao crescimento religioso (White, 1999a: 42).

O educador precisa conhecer o funcionamento da memória e os motivos que tornam uma informação mais interessante que a outra. O educando estabelece prioridades e preferências de acordo com o que lhe é próprio ou familiar. Por isso, os procedimentos e os recursos de ensino devem ser os mais variados, de forma que estimulem todos os sentidos.

Nosso Salvador ligava Suas preciosas lições às coisas da natureza. As arvores, os pássaros, as flores dos vales, as colinas, os lagos, o belo firmamento, assim como incidentes e o ambiente da vida diária, tudo ligava-o Ele às palavras da verdade, para que Suas lições fossem muitas vezes trazidas à memória, mesmo em meio dos absorventes cuidados da trabalhosa vida humana (White, 1990: 85).

O uso de tecnologias como recurso educacional deve ir além do ensino instrumental. A pratica educativa que valorizará o ser humano não depende do fato de usarmos uma caneta ou um computador, mas dos significados que estamos produzindo nessa interação social.
É necessária clareza nas concepções de ensino e aprendizagem que estão por trás do uso dos recursos tecnológicos. Caso contrario, teremos ainda cartilhas eletrônicas revestidas de modernidade com concepções arraigadas em pedagogias tradicionais.
O livro didático também é um importante aliado do docente na apresentação dos conteúdos em sala de aula. Baseado nesse entendimento, na escolha e utilização do livro e de todo e qualquer outro material didático e paradidático, deve-se considerar a concepção filosófica apresentada e certificar se é coerente com as concepções filosóficas da Educação Adventista. Pois o pensamento do autor e suas crenças ali expostas a partir da seleção de textos, da proposição de atividades e mesmo da indicação de leituras, filmes e sites.
A ordem de utilização dos livros não deve ser determinada pelo autor, e sim pela Unidade Escolar, através do planejamento curricular e do momento. Há bastante tempo não caba ao docente planejar as aulas seguindo o sumario do livro, limitando o conteúdo da aula ao que está prescrito por determinado autor.
Cabe lembrar que nenhum livro didático contém todo o desenvolvimento necessário ao desenvolvimento do estudante. Dessa maneira, é preciso que educando e educador invistam tempo na consulta de diversas fontes de informação, tais como livros, revistas, jornais, enciclopédias, sites e filmes.
Se por um lado o livro não contém todo o conhecimento necessário, nem toda a verdade sobre determinada temática, por outro a sua não utilização é o oposto radical, tendo em vista que para muitas famílias o livro é a principal fonte de pesquisa e sistematização didática. Através dele, o educando pode se reporta quantas vezes quiser e necessitar ao conteúdo tratado em sala.
Livro didático não deve limitar a ação pedagógica, mas ser instrumento de apoio ao educando e ao educador. O seu uso possibilita abrir espaço para discussões relevantes que levem o educando a perceber o entorno social com visão critico-cristã e construir valores e princípios.

O Senhor espera que nossos professores excluam de nossas escolas livros que ensinam conceitos que não estão de acordo com Sua Palavra, e dêem lugar aos livros do mais alto valor. É o desígnio do Senhor que os professores das nossas escolas sobrepujem em sabedoria a sabedoria do mundo, porque estudam a Sua sabedoria. Deus será honrado quando os professores das nossas escolas, desde os cursos superiores até os mais baixos, revelarem que possuem mais do que simples sabedoria humana, pelo fato de estar à frente o Mestre por excelência (White, 1996b: 517).

A utilização dos recursos apresentados não substitui a explanação e a argumentação em sala de aula. Ao contrário, essas abordagens caminham juntas, são interdependentes, adquirindo um novo sentido. Não se trata daquela aula expositiva em que o educador fala e o educando ouve, mas de uma integração dialógica. Envolve reflexão e posicionamento crítico, impulsionando o educando para a solução de uma situação-problema, impelindo-o a uma investigação metodológica. Enquanto o educando investiga em busca de respostas, o educador age como mediador, ao confirmar ou refutar suas hipóteses, e ambas aprendem.
As possibilidades didático-metodológicas apresentadas até então podem estar associadas ao trabalho através de projetos. Na perspectiva de Hernandéz (1998: 26-31), os projetos são considerados “uma concepção de ensino, uma maneira de suscitar a compreensão dos educandos sobre os conhecimentos que circulam fora da Escola e de ajudá-los a construir sua própria identidade.”
Bomtempo (1997: 6-11) afirma que trabalhar através de projetos é antes de tudo adotar uma atitude intencional, um plano de trabalho, sob a coordenação do educador. Ou seja, não é meramente uma técnica de ensino mais atrativa para o educando.
Entra as vantagens de trabalho através de projetos, destacam-se as seguintes: pressupõe um trabalho de elaboração coletiva envolvendo educandos e educadores; dá funcionalidade ao que será aprendido e sua duração depende do nível de abrangência do tema e do interesse do grupo; possibilita uma avaliação processual durante a seqüência de situações de aprendizagem, valorizando a função dos registros; supõe que a aprendizagem, vinculada ao fazer, resgata a atividade manual ou artesanal que a cultura vinculada à perspectiva do conhecimento globalizado ocidental tende a menosprezar; favorece a organização do currículo integrado; supõe que todos podem aprender e que possuem papéis diferentes e necessários; possibilita um contato com as práticas sociais reais; favorece a iniciação cientifica em qualquer nível de ensino.
Trabalhar por projetos, portanto, envolve sempre a resolução de problemas, possibilitando a análise, a interpretação e a crítica por parte dos educandos. Não há uma fórmula ou modelo pronto do como desenvolver projetos em sala de aula, mas sim uma postura coerente na forma de compreender e vivenciar a experiência escolar.
É preciso que o coordenador pedagógico e o docente verifiquem sua realidade, recurso, perfil das turmas, interesse, calendário pedagógico, ou seja, o contexto em que se encontram inseridos, para que o trabalho através dos projetos não se caracterize num modismo, nem seja uma obrigação ou uma única prática pedagógica.
Enfim, a metodologia empregada na Educação Adventista deve contribuir para que o educando possa estar em permanente desenvolvimento, em todos os aspectos, e o seu caráter possa ser moldado conforme o modelo do Filho de Deus, pois só assim a educação alcançará seus objetivos.